O MITO DE FRANKENSTEIN
PARTE IV
“ESPELHO, ESPELHO
MEU...”
Para compreendermos qual a ideia da
produção e massificação desses mitos criacionais, precisamos compreender uma
questão central, que se refere principalmente a qual o verdadeiro motivo que
levou o Criador a expulsar ou a abandonar sua criação, seu próprio “Filho”? O
que causou tamanha ojeriza e repulsa que fez com que o “Pai” renegasse sua
obra, ao ponto de abandonar sua cria à própria sorte, ao “Deus dará”?
Notem que esse é sempre o ápice
desse tipo de alegoria, algo extremamente cruel, injusto, covarde e de certa
forma frívolo por parte de um ser que está situado num nível muito acima dos
demais seres. É uma situação tão surpreendente e inverossímil que causa sempre
espanto ao leitor incauto, graças a condição non sense e inesperada, que a
trama passa a percorrer. Uma posição
imperdoável para o patamar que o Criador ocupa na cadeia hierárquica de ser
divinizado ou genial.
Sem dúvida nenhuma, tal postura
irresponsável ocorre por um único motivo: o próprio reflexo. Tanto o Criador no
Pecado Original, como Dr. Frankenstein no conto homônimo, se assustam, se
horrorizam com o que criaram. E tal insatisfação acontece de forma tão
irrefreável que o Criador não consegue nem mesmo disfarçar seu desconforto em
relação àquilo que ele gerou. A grande causadora de tamanho asco se deve
unicamente ao fato dessas criaturas refletirem através de sua forma de ser, de
se comportar, de sentir e de agir, o próprio Criador. Essas Criaturas espelham
de forma fidedigna aqueles que os geraram; são cópias autênticas de seu
progenitor. Não é a toa que o próprio Antigo Testamento afirma ser o “homem imagem e semelhança do Pai”, retrato do sujeito que o originou.
Isso também elucida certas atitudes do Deus do Gênesis e do Dr.
Frankenstein que sempre relutaram em dizimar suas crias, mesmo com todos os
erros realizados por estas em relação a desobediência no caso do Mito do Pecado
Original, ou do assassinato da esposa do Dr. Frankenstein, no Mito de Mary
Shelley. Esse relevar, esse “passar a mão na cabeça” do Criador em relação à
criatura representa a incapacidade deste em cometer um suicídio, pois ao
aniquilar sua cria, ele estaria, indiretamente, se auto-dizimando.
Por fim, é relevante analisar, afinal, o que os assustaram a ponto
de renegarem a patente de sua invenção. O que eles viram que os deixaram em uma
situação de tamanho descontrole, levando-os à expulsarem, à abandonarem sua
cria logo após seu surgimento?
Eles se assustaram com eles próprios. Através de Adão e Eva,
por um lado, e o Monstro de Frankenstein, de outro, seus respectivos criadores
tomaram um contato direto, aberto e franco consigo mesmos. Eles se viram
através de suas crias; e, como ficou bem claro, abominaram e execraram aquilo
que viram. Isso porque constataram de maneira muito áspera e crua ângulos que
até então nunca tinham observado em si próprio. Notaram detalhes sobre eles
mesmos que nunca haviam percebido e isso causou neles uma dor muito grande pois
através de suas crias eles atentaram para quem eles realmente eram de forma
mais completa e ampla. Então, toda aquela impressão que tinham de que eram
perfeitos, divinos e geniais, enfim, toda essa idealização esquizofrênica,
fruto de uma imaginação delirante e enfermiça não passavam de meras quimeras,
devaneios e sonhos, fruto de uma mente doentia e aterrorizada pela não
aceitação de seus limites, fragilidades, pequenez e mortalidade.
Mas, o que estes seres tão à frente dos demais esperavam de
seu fruto? Será que eles não tinham conhecimento que tudo que se cria espelha
seu artífice. Que tudo que existe não passa de um eterno holograma geracional,
pois estamos fadados a só podermos criar algo semelhante a nós. Que tudo o que
fazemos, produzimos ou criamos são reflexos diretos e proporcionais de nós mesmos,
independentemente de nossa vontade ou desejo. Basta olhar para nossos filhos,
para nossos textos, comportamentos, expressões, reações, em nosso trabalho,
enfim, em tudo o que atuamos, agimos e criamos sempre os frutos foram, são e
serão nossos revérberos.
Esses seres divinizados e muito acima da natureza concreta
são, na verdade, seres humanos fantasiados que têm como principal objetivo,
fazer com que os demais seres humanos
acreditem nesses mitos e passem a trabalhar para estes em troca da vã promessa que
um dia estes também conseguirão atingir esse ápice de divinização atemporal.
Assim criam uma roda de crenças absurdas em que devotarão toda sua existência
sem nunca encontrar nada disso. Inocentes úteis, vítimas de mentes
mal-intencionadas, que buscam a manutenção desse status privilegiado de uma
pequena elite, detentora de 90% das riquezas.
E aqui vemos onde está o verdadeiro milagre “divino” dessa
sociedade cristã, ou seja, graças à esse tipo de crendices insensatas,
entronizada no populacho desde de seu nascimento, se consegue transformar a
maioria em lacaios escravizados, animais irracionalizados, que só vivem para
servir e eternizar esse status quo, onde eles próprios são os marginalizados.
Prova da esquizofrenização do povo, que se autoflagela como se não houvesse
outra alternativa a não ser sofrer, adoecer, tolerar e se resignar nessa vida,
apostando todas as suas fichas num pós-morte que nunca ninguém vislumbrou de
maneira verdadeira e real. Aposta incerta e típica de quem não sabe e não
entende o jogo da vida.
Aqui encerramos nossa análise acerca
do Mito de Frankenstein. Nas próximas postagens iremos abordar o tema do gênero
feminino dentro dessas abordagens criacionistas. Falaremos acerca do papel de
Eva dentro do Mito do Pecado Original, dos contos de Branca de Neve, Cinderela,
Alice, etc. Dentro dessa mesma perspectiva das análises até aqui, buscando os
verdadeiros motivos por trás dessas inocentes e pueris estórias de contos de
fadas.
Abraços
cordiais
Fernando
Manarim
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