O MITO DE FRANKENSTEIN
PARTE II
Como foi salientado na postagem
anterior, o mito de Frankenstein tem como tema principal a criação da vida,
tema similar ao mito do Pecado Original, anteriormente analisado. E, é
exatamente por isso que esse mito foi escolhido, pois nosso objetivo é
demonstrar que não só esses dois mitos, como todos os mitos que tem como foco
principal o tema da criação, são similares, já que dentro de seu momento
histórico, narram a mesma trama e querem comunicar o mesmo tipo de moral da
estória, o mesmo “modelo a ser seguido” peremptoriamente. Nossa proposta é apresentar as similaridades
de conteúdos e de objetivos que tanto o Mito do Pecado Original como o Mito de
Frankenstein, trazem em seu bojo. E em um segundo momento, podermos tirar conclusões
através do como, do por que e onde eles querem chegar através de tais
artimanhas astuciosas, nos ludibriando e nos levando aos erros sem nunca nos
deixar enxergar o que se oculta desses véus tão cheios de segundas intenções.
Começaremos analisando a questão da criação em si. Como foi gerado
o “Monstro”, no mito escrito por Mary Shelley? A criatura nasceu da mente de um
cientista prepotente e obstinado, que acreditava ser capaz de realizar qualquer
coisa, até mesmo criar vida, não qualquer vida, mas, especialmente de seres
evoluídos, semelhantes à raça humana, ou seja, semelhantes ao “Pai”. Imagem e
semelhança com aquele Deus do Gênesis, prepotente, arrogante e acima de tudo e
de todos. Tanto o Dr. Frankenstein quanto o Deus Criador da Bíblia, apresentam,
dentro de suas particularidades, a mesma característica de personalidade, já
que representam o mesmo personagem dentro dessa narrativa criacional. São
poderosos, inteligentes, obstinados; como afirmam na bíblia, seres
“oniscientes, onipotentes e onipresentes”, qualidades inventadas e impossíveis
de se constatar por qualquer ser vivo que habite nosso planeta. Aqui a intenção
essencial é criar uma aura de perfeição e infinitude que os absolve e os coloca
acima de qualquer julgamento, acima do bem e do mal, seres que ultrapassaram o
estágio humano, daí a coroa divinatória que lhes cobre a cabeça. Pelo menos
essa é a primeira intenção dos autores do Gênesis e de Frankenstein. Por serem
criadores não podem ser avaliados pelas criaturas e com isso ganham status de uma
soberania perfeita, única e eterna, podendo até “escrever certo por linhas
tortas”, frase dogmática de um descalabro irracional e ilógico que chega a
ferir mentes com um mínimo de inteligência autonomia.
Uma segunda característica a ser salientada é que para criar
a vida, ambos empregaram materiais similares, de substâncias amorfas e de
feições diversas ao produto gerado. Frankenstein se utilizou da mistura de
diversos cadáveres para poder gerar seu “monstro”; narrativa semelhante ao que
o Gênesis nos contou quando afirmou que Deus criou vida através de matéria
inócua e sem vida que ele encontrou no Universo. Tanto um quanto outro são
artífices criativos que podem transformar coisa morta em algo novo e vivo,
barro em vida, o nada em tudo. De novo, a supervalorização do personagem do
Criador, pois lhe dão um caráter e uma importância descomunal de infalibilidade
e potencialidade infinitas e mágicas, como se só eles pudessem atingir tal
nível, ou como se isso fosse possível a um ser naquele momento que tais
“milagres” foram realizados . Tudo isso no campo da imaginação e do delírio de
pessoas mal intencionadas, com finalidades de dominação e controle da maioria, inventando
estórias com o intuito de enquadra-las através dos medos, frustrações,
angustias e de sua ignorância. Sempre gerando culpas, dívidas morais,
insatisfações; negações e agravando o quadro das pessoas até que entrem num
quadro de esquizofrenia, fazendo com que essa maioria amedrontada deixe de ver
e de viver a realidade, o presente possível, o cotidiano com plenitude e sem
nenhum tipo de disformidade imaginária para lhe desviar a atenção de cada
instante. Sempre acorrentados ao passado ou com medo do futuro, fruto de um
adestramento compulsivo e irreal. Resultado de culpas inatas, próprias dos
seres humanos, sempre, como numa prosa kafkiana, réus de um crime já
sentenciado e sem nenhuma chance de defesa. Culpados de serem como são, vítimas
de um crime que eles não cometeram, por não serem criadores mas antes criaturas,
resultados ao invés de produtos, restos de uma equação que nunca bate, que
nunca zera e que nunca se resolverá.
Outro fator a ser destacado é que o
Dr. Frankenstein para dar vida ao Monstro, se utilizou de energia elétrica gerada
através de enguias. De novo, um símile similar a passagem do antigo testamento
que diz que através da Luz Deus gerou vida no Universo. Novamente, um ser que domina
e emprega ao bel-prazer os materiais disponíveis, um artífice perfeito e
criativo que sujeita a natureza a seus caprichos e desejos. O poder infinito de
quem tudo pode e tudo vê, falácias e mais falácias que somente mentes doentes e
distantes da realidade podem se deixar envolver. Só quem usa fé, quem emprega a
crença como principal ferramenta de vida, acaba prisioneiro de sua ignorância.
E só os ignorantes podem ser manipulados e dirigidos facilmente, já que não
conseguem entender por si mesmos o que realmente se passa à sua frente. São
cegos com visão, porque simplesmente se negaram a enxergar. Por costume e por
comodidade, abdicaram de pensar por si mesmos, ficando reféns de quem lhes
cobrem o sentido das coisas, condição parecida com o que Hegel afirmava ao
dizer que o escravo aceitava tal condição por si mesmo, ou seja, ele era
escravo por escolha e não apenas por uma imposição violenta de quem o
escravizara.
Eis o que representam os mitos da
criação: tramas inventadas por mentes mal intencionadas, que sabem como
controlar e manipular a maioria do populacho, inocente, temeroso e ignorante.
Tudo isso com o objetivo de tirar vantagem e se eternizarem no ápice da
sociedade.
Continuaremos a análise do Mito de
Frankenstein na próxima postagem.
Felicidade a
todos!
Fernando
Manarim
Nenhum comentário:
Postar um comentário